segunda-feira, 3 de novembro de 2014

Para os braços do meu pai

Sinto a tua falta. Sempre senti para dizer a verdade. O meu pai sempre serás tu. E não podia ser de outra maneira não é? Visto que és realmente o meu pai. Parece estranho dizer isto não parece? Mas podia simplesmente renegar-te, já que não foste tu que me criaste e educaste. Não foste tu que me deu colo quando mais precisei. Não foste tu que me amparou quando precisei de um colo seguro para andar comigo quando fiquei quase paraplégica. Não foste tu que participou em muitas coisas da minha vida. Não me deste um abraço quando soube que tinha o meu problema de saúde. Foi o meu avô. E agradeço-lhe, do fundo meu coração, por tudo o que fez por mim. Por nós. Trabalhou muito para nada nos faltar. E custa-me saber, com muita pena minha, que nunca fizeste nada para fazer o contrário do que fazias. Ignoravas, simplesmente, ignoravas! Passavas ao lado. Desculpas e mais desculpas e isso marca uma pessoa. Por muito forte que seja. Se me sinto triste? Sim. Se me sinto revoltada? Há dias que sim. Se acho que tudo podia ter sido diferente? É claro que acho.. Vi-te chorar. Sofrer. Passar fome e frio. Dormir onde nem os cães devem dormir, que é na rua. Vi-te pedir esmola a quem tinha mais e vi também ser-te negado um prato de comida. Sentia pena, mas muito pouco podia fazer. Lembro-me de uma vez estarmos a jantar em família (?) e a minha avó fazer-te o prato para levar-te à "cama". Nessa altura dormias num barracão que a casa da minha mãe tinha (tem) no fundo do quintal. Fui em medo. Era escuro e não havia luz. Nem casa de banho. Não havia nada. Apenas tu na escuridão daquele barracão que para ti, durante algum tempo, foi a tua casa. A única que tinhas, para dizer a verdade! Estavas deitado com o "fox" ligado a ver não sei bem o quê. Ainda hoje guardo a tua cara quando olhou para mim. Desespero. Medo. Angústia. Tinhas cara de quem precisava de ajuda. Mas que poderia eu fazer? Era uma miúda de 7/8 anos (se tanto!) que estava a ver a coisa como sendo "normal". Guardo para mim muitas outras recordações contigo. Também as existem boas, mas as tristes, as de desilusão, de medo, aquelas que marcam de forma dolorosa, essas são maiores. Em tudo. Maiores em dor e sofrimento e maiores em quantidade. Tenho pena. Muita pena. Sofreste bastante. Secalhar mais do que devias ter sofrido. Mas isso não me cabe a mim dizer. Cabe-me esperar que as coisas não acabem mal. Resta-me esperar que tudo passe e ninguém te leve de mim. Ninguém tem esse direito. Seja quem for, pelas razões que for. Agora és (um pouco mais) pai. O meu pai. Aquele que sempre foi O meu pai, mas que nunca foi UM pai. 
Espero que um dia possa olhar para trás e ver que tudo passou. Que não existe mais nada acumulado cá dentro. Apetecia-me abraçar-te, mas a distância não ajuda e mais uma vez tu não ajudas também. Espero que um dia possas vir à minha casa. Sem pedir-te para que venhas. Espero por ti, aqui, à dois anos e um mês! 
Amo-te chinês!

2 comentários:

  1. Ai Neuza!, que agora fizeste-me chorar!
    Há histórias tanto tristes que a gente nem imagina! Por vezes é preciso a gente dar um passo, pequenino apenas, para que tudo se esclarece e os corações se aquietem. Vai lá, conversa com a alma e abre-lhe o teu coração, que tens a perder?!! Coragem!

    Tudo de bom para ti

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    1. Obrigada querida. Eu gostava, sinceramente, de pensar assim. Mas infelizmente, ao fazer esta conversa ao meu pai, ele vai desvalorizar tudo isso. Que não fez mais porque nao podia e bla bla bla, mas eu sei que não foi assim. Guardo para mim. Vou escrevendo aqui alguns episodios.

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